segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Breve manual da arte da boa conversa - parte I

Escrito por Xico Sá 



Totalmente baseado no “Chá das Cinco com Aristóteles” , livrinho incrível que achei milagrosamente em um sebo do Rio, deixo aí algumas singelas dicas sobre a arte da conversa em mesa de bar, restaurantes e cozinhas caseiras e outras rodas sociais.

A arte da boa conversa, convenhamos, está cada vez mais em baixa. Em campanha permanente por mais oralidade de corpo presente.

“A este falta café”. Assim os espanhóis do tempo de Mariano José de Larra, o maior cronista de costumes do século XIX, reclamavam dos ruins de papo, atribuindo a culpa à ausência do hábito de frequentar bares e cafés de Madrid.

É realmente no vinho ou na cerveja, entre os amigos ou adversários cordiais, que adquirimos tal arte. Ao nosso breve manual:

1) Um ligeiro gaguejar pode até oferecer um entusiasmo peculiar à conversa, ampliando o suspense nas suas boas palavras.

2) Nada pode ser mais irritante do que um interlocutor que diz o tempo todo: “Exatamente!, exatamente!!”

3) Nunca diga “não tenho nada contra isso, mas...” Adversativa imperdoável.

4) Nunca diga “no meu tempo...”

5) Nunca termine uma sentença com um inescrupuloso “você não acha?”

6) Evite o samba-exaltação na linha “encantador, encantador!”. Murmúrio de pseudo-artista.

7) Nunca seja escrupulosamente sincero ao ponto de questionar cada fato e corrigir qualquer impropriedade.

8) O mentiroso de qualquer espécie sabe que a recreação, e não a instrução, é a alma da conversa e acaba sendo muito mais civilizado do que o cabeça-dura que fica alardeando sua desconfiança em relação a uma história que é contada apenas para entreter a platéia.

9) Nelson Rodrigues e outras usinas de boas frases. Citações ad infinitum, evitemos, pois. Prefira o naturalismo-realista e conte histórias ou situações do seu próprio cunhado safado, da sobrinha tentadora, da vizinha do 204 etc.

10) Não conte filmes.

11) Muito menos sonhos. Interpretá-los em público, nem pensar, meu caro.

12) Não demonstre o seu cabacismo tecnológico, de modo a exaltar qualquer nova geringonça ou novidadismo do gênero.

13) Prefira a superfície bem fundamentada ao obscurantismo das teses ditas profundas -nota de rodapé em mesa de botequim é um desperdício.

14) Em caso de desconhecidos na mesa, não faça a maldita pergunta "o que você faz" logo nos primeiros goles.

15) Nunca se exalte demais diante de uma mulher bonita e gostosa ao ponto de querer discutir Machado de Assis, Osman Lins, Murilo Rubião, Faulkner ou Hemingway com ela nos primeiros cinco minutos de conversa.

Deixe agora as suas dicas. Pois voltaremos muito breve ao tema.

2 comentários:

  1. 16) Dialogar sobre futebol é uma beleza, desde que com respeito. O assunto rende longas histórias e brincadeiras, independentemente do gênero que está na mesa. Porém não se aventure a persuadir o outro de que sua equipe é maior que as demais. Para o torcedor de verdade seu time e único e o amor incondicional.

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  2. 17) Seja gente de verdade e não faça pose em uma incursão etílica. Pelo menos se ficar de porre continua sendo autêntico. Já, perder a pose, é pra quem bebe tendo algo a perder.

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Muito agradecida!